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Diferença entre porte de drogas e tráfico de drogas

26/03/2024 às 15:05
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À primeira vista, a diferença entre porte de drogas e tráfico de drogas parece um tanto óbvia para a maioria das pessoas. Porém, no mundo jurídico, essa é uma dor de cabeça e tanto. A falta de critérios objetivos para a diferenciação das duas situações faz com que muitas pessoas se vejam em verdadeiros apuros em processos que deveriam ser razoavelmente simples.

A dificuldade, porém, denuncia a importância de uma atuação especializada no assunto por parte do advogado do réu. No artigo de hoje, debateremos um pouco sobre a diferença entre porte de drogas e tráfico de drogas, como ela é a avaliada e a importância de contar com uma defesa sólida para o seu caso.


Diferença entre porte de drogas e tráfico de drogas na legislação

Na legislação brasileira, a diferença entre porte de drogas e tráfico de drogas pode ser observada com clareza na lei nº 11.343 de 2006. Nela, o artigo 28, que define o chamado uso ou porte de drogas, faz parte do título referente às “Atividades de prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuário e dependentes de drogas”. Já o artigo 33, referente ao tráfico, faz parte do título referente à “Repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas”.

A diferença de tratamento também pode ser vista na diferença da gravidade de punição. Observe como a lei define o porte e o consumo de drogas:

Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:

I - advertência sobre os efeitos das drogas;

II - prestação de serviços à comunidade;

III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.

A legislação determina advertência, prestação de serviços à comunidade e medidas educativas. Já no caso do tráfico, a situação é bastante diferente:

Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.

§ 1º Nas mesmas penas incorre quem:

I - importa, exporta, remete, produz, fabrica, adquire, vende, expõe à venda, oferece, fornece, tem em depósito, transporta, traz consigo ou guarda, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas;

II - semeia, cultiva ou faz a colheita, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, de plantas que se constituam em matéria-prima para a preparação de drogas;

III - utiliza local ou bem de qualquer natureza de que tem a propriedade, posse, administração, guarda ou vigilância, ou consente que outrem dele se utilize, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, para o tráfico ilícito de drogas.

IV - vende ou entrega drogas ou matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas, sem autorização ou em desacordo com a determinação legal ou regulamentar, a agente policial disfarçado, quando presentes elementos probatórios razoáveis de conduta criminal preexistente.

A punição pode chegar a até 15 anos de prisão pelo tráfico. Outra característica importante para se entender das definições legislativas é que o tráfico é equiparado, também, ao armazenamento, ao cultivo e a qualquer outro tipo de fornecimento ou parte do fornecimento comercial da droga.

Essa amplitude do significado de tráfico é outro problema significativo. O artigo 33 é explícito ao determinar no crime de tráfico os atos de quem “tem em depósito, transporta, traz consigo ou guarda” a droga. Todas essas ações também estão na definição da posse de droga. Para piorar o caso, não há um critério legal para determinar até qual quantidade se entende a mera posse. Para tentar diferenciar algo tão subjetivo, existem critérios usados na prática, que abordaremos a seguir.

O entendimento prático da diferença entre porte e tráfico de drogas

No tópico acima, mostramos o ponto central da dificuldade de determinar a diferença entre porte de drogas e tráfico de drogas a partir do texto legal. Porém, é evidente que, mesmo com dificuldades legislativas, é necessário contar com soluções na prática cotidiana.

Para isso, existem alguns critérios utilizados pela polícia, pelo Ministério Público e pelo Poder Legislativo para tentar definir a diferença entre porte de drogas e tráfico de drogas:

O tipo de droga que o indivíduo possui

É evidente que existem usuários de todos os tipos de drogas – caso contrário, sequer existiria razão para traficar. Porém, em regra, um usuário não carrega consigo todo um catálogo de variedades de drogas.

Neste sentido, quando alguém é flagrado com dois ou mais tipos de droga, existe uma sugestão de que aquela pessoa tende a estar oferecendo os itens. Isso se aplica mesmo a quantidades que sejam consideradas pequenas.

Uma pessoa que carrega consigo duas pedras de crack, algumas buchas de cocaína e poucos gramas de maconha não está com uma quantidade volumosa de substâncias. Mas é muito improvável que essa variedade seja para consumo próprio. Isso auxilia na definição de que se trata de um caso de tráfico e não de posse.

A quantidade de droga

Outro fator clássico para a definição da diferença entre porte de drogas e tráfico de drogas é a quantidade. Pode-se começar por exemplos extremos: existe uma diferença muito clara entre o indivíduo que carrega um cigarro de maconha no bolso e o indivíduo que carrega um porta-malas cheio da mesma substância.

Embora o exemplo anterior seja muito evidente, as dificuldades começam quando as quantidades passam a se aproximar. Um indivíduo que tenha pouca quantidade de maconha pode ser um mero usuário. Mas alguns gramas também são suficientes para fazer algumas vendas. Como a legislação não possui um critério objetivo para essa separação, casos em que a quantidade é dúbia precisam contar com outros critérios somados.

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O local e as condições da situação

O local e a situação também são fundamentais para diferenciar entre porte de drogas e tráfico de drogas. Isso é especialmente utilizado em conjunto aos outros elementos, em situações nas quais a quantidade não é capaz de responder a diferenciação.

Imagine, por exemplo, uma pessoa que é pega com um pequeno volume de drogas em um local tipicamente conhecido por ser um ponto de venda da substância. É natural que, neste local, sejam encontrados traficantes e usuário.

Porém, se a pessoa está com uma grande quantia em dinheiro, com registros de vendas e elementos adicionais, como balanças e invólucros, isso sugere que ela esteja relacionada à comercialização – e não ao consumo.

A conduta do indivíduo e antecedentes criminais

Condutas como a tentativa de esconder a droga com técnicas “profissionais”, portar armas e agir em benefício do ponto de vendas também sugerem que a pessoa tenha algum envolvimento com a comercialização, e não apenas com o consumo da droga.

No mesmo sentido, antecedentes no tráfico são um indicativo de manutenção da conduta. Este fator, porém, deve ser analisado com cuidado. O fato de uma pessoa já ter respondido por um processo de tráfico de drogas não significa que ela continuará praticando o crime. Trata-se apenas de um elemento entre muitos outros para a análise da situação.

A complexidade da diferença entre porte de drogas e tráfico de drogas e a importância de contar com uma defesa sólida.


Como você viu nos itens do tópico acima, há uma série de interpretações que são subjetivas na diferenciação entre porte de drogas e tráfico de drogas. Por mais que se fale na existência de critérios como quantidade, tipos e antecedentes, o fato é que o significado disso ainda depende de interpretação.

Não existe na legislação uma determinação do peso a partir do qual o porte se transforma em tráfico, por exemplo. Também não há qualquer determinação legal para interpretar que uma pessoa já presa por tráfico de drogas tenha menos chances de ser apenas usuária do item no momento do seu flagrante. Essas incertezas dificultam e complexificam o debate, pois reduzem a disponibilidade de critérios objetivos.

Diante todos esses fatores, soma-se uma característica social inegavelmente arraigada nas raízes do país. Estatisticamente, é mais comum ver pessoas de certas classes sociais terem quantidades mais significativas de droga interpretadas como porte, ao passo que pessoas de classes mais baixas são acusadas de tráfico mesmo com quantidades menores em mãos. Essa falta de objetividade é, ao mesmo tempo, um problema social e um forte espaço de defesa.

Contar com a subjetividade intrínseca a casos de porte de drogas e tráfico de drogas é ter a certeza de que a interpretação também depende muito da defesa. Um advogado criminalista experiente no assunto conhece muitos dos critérios essenciais para construir uma defesa sólida.

O profissional será capaz de explicar a situação para o cliente e maximizar as chances de uma defesa justa, menos propensa a crenças arbitrárias e a impactos das características sociais que cercam o julgador.

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Sobre o autor
Galvão & Silva Advocacia

O escritório Galvão & Silva Advocacia presta serviços jurídicos em várias áreas do Direito, tendo uma equipe devidamente especializada e apta a trabalhar desde questões mais simples, até casos complexos, que exigem o envolvimento de profissionais de diversas áreas. Nossa carteira de clientes compreende um grupo diversificado, o que nos força a ter uma equipe multidisciplinar, que atua em diversos segmentos, priorizando a ética em suas relações e a constante busca pela excelência na qualidade dos serviços.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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