Possibilidades Legais De Que o Ensino Escolar Presencial Não Seja Obrigatório Para Crianças Com Autismo

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RESUMO

No Brasil, a socialização de crianças em idade escolar costuma ser promovida nas instituições de ensino públicas ou privadas, pois os pais, bem como o Governo e a sociedade em geral esperam que crianças e adolescentes adquiram uma variedade de oportunidades e conhecimentos fora da família e acreditam que as habilidades sociais dos indivíduos na infância são obtidas prioritariamente na escola. Contudo, outros países, principalmente os mais desenvolvidos, ao comparar os alunos que estudam em casa às crianças que frequentam escolas convencionais, sugerem que alunos no homeschooling (ensino domiciliar) têm amizades de melhor qualidade e melhores relacionamentos com seus pais e outros adultos, além de serem tão felizes, otimistas e satisfeitos com suas vidas quanto os que estudam em uma instituição de ensino. No caso da criança autista, que tem como principais sintomas a agressividade, dificuldade de interação social, comportamento repetitivo e intolerância a barulhos altos como os que costuma ser comuns na escola, o ensino em casa é uma boa opção, pois aumenta a possibilidade dela adquirir conhecimentos, senso social e responsabilidade, bem como assegura que ela consiga exibir menos tumulto emocional e comportamentos problemáticos do que seus pares. Dessa forma, o presente estudo tem como foco responder se a lei deve definir como as crianças com Transtorno do Espectro Autismo (TEA) devem, realmente, ser obrigadas a frequentar instituições de ensino regulares e/ou especiais, abordando o autismo, apresentando particularidades, necessidades e principais tratamentos para essa patologia, destacando os benefícios de um modelo de ensino cuja lei respeite adaptações às necessidades da criança com TEA. Para alcançar esse objetivo, foi realizada uma pesquisa bibliográfica, buscando mencionar as legislações que abordam os direitos e deveres das pessoas deficientes e especificamente do público autista; apresentar sintomas, causas e tratamentos para o autismo; e expor o homeschooling como uma possibilidade legal para a criança autista.

Palavras-chave: Autismo. Ensino Domiciliar. Prós e Contras do Homeschooling. Direito à Educação.

1 INTRODUÇÃO

 

Nos dias atuais, as deficiências e necessidades dos indivíduos com algum tipo distúrbio, transtorno ou limitação física/psicológica têm sido muito discutidas não só dentro das instituições de ensino, mas também nos mais diversos órgãos governamentais e não-governamentais, devido a importância que esse assunto possui principalmente para aqueles que dependem do ensino inclusivo. E como sabe-se que os direitos humanos não são contemplados em sua totalidade, mesmo anos após terem sido proclamados, educadores, educandos e profissionais do Direito precisam se concentrar em compreender a Pessoa com Deficiência- PcD (termo definido pela Convenção das Nações Unidas) em sua totalidade, suas particularidades e os direitos garantidos aos mesmos.

Quando se trata do autismo, já existem leis específicas para o atendimento dos indivíduos com TEA (Transtorno do Espectro Autista), bem como institutos legais direcionados para os deficientes em geral, que podem ser utilizados para assegurar o acesso dos autistas aos seus direitos. Dentre esses direitos, destaca-se o de escolarização, que envolve programas e ações que visam à garantia do apoio adequado aos estudantes com TEA, bem como a permanência, a participação e a aprendizagem desses alunos nas escolas públicas regulares.

Contudo, a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves e Sandra dos Santos Andrade, pós-doutora em Educação e professora da Faculdade de Educação da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) defendem que o modelo de ensino obrigatório pode ser um obstáculo para a concretização do direito fundamental a educação das pessoas com TEA, especialmente depois que a pandemia ocasionada pelo COVID-19 mostrou os benefícios do ensino em casa. Assim, pensando nisso, o presente estudo tem como foco responder a seguinte questão norteadora: deve a lei definir a obrigatoriedade do ensino presencial em instituições regulares às crianças portadoras de TEA?

Para responder a esse questionamento, o objetivo principal do estudo a ser elaborado é abordar o autismo, apresentando particularidades, necessidades e principais tratamentos para essa patologia, destacando os benefícios de um modelo de ensino legal adaptado às necessidades da criança com TEA. Por sua vez, os objetivos específicos incluem: mencionar as legislações que abordam os direitos e deveres das pessoas deficientes e especificamente do público autista; apresentar sintomas, causas e tratamentos para o autismo; e expor o Homeschooling (ensino domiciliar) como uma possibilidade legal para a criança autista.

A justificativa para o estudo desse tema está no fato de existirem muitos institutos legais direcionados às crianças com necessidades especiais, mas os mesmos se apresentam como uma obrigação e não como parte dos direitos fundamentais, indicando a possibilidade das partes escolherem a melhor opção de ensino. E como o autismo trata de uma disfunção global do desenvolvimento relativamente nova e com poucas legislações direcionadas exclusivamente para essa síndrome; torna-se essencial analisar doutrinas, jurisprudências e demais institutos legais que indiquem outras opções de ensino além da assegurada por lei nas escolas regulares públicas.

Além disso, é fundamental enfatizar que a escolha por colocar a criança na escola ou ensiná-la em casa deve ser dos pais e/ou responsáveis, tendo em vista que a responsabilidade dos mesmos para com um indivíduo vulnerável como é o caso da criança e do adolescente, é um dever irrenunciável. Prova disso é que o artigo 227 da Constituição Federal confere à família, além do dever de educar, a responsabilidade pela convivência e o respeito à dignidade dos filhos; enquanto o artigo 229 atribui aos pais o dever de assistir, criar e educar os filhos. Por sua vez, a Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA), evidencia os deveres inerentes ao poder familiar, que incluem as obrigações não só do ponto de vista material, mas também no âmbito afetivo, moral e psíquico. Já o artigo 1.634 da Lei 10.406/2002 (atual Código Civil Brasileiro - CCB) fixa entre os deveres conjugais, o de sustento, criação, guarda, companhia e educação dos filhos.

Baseado nessas colocações, nota-se que não só deve ser considerado que a forma de ensino aplicado à criança deve ser uma opção dos pais/responsáveis, como também é preciso analisar a contradição de um direito como o da educação ser imposto aos cidadãos, quando, na verdade, deveria ser um benefício, opção ou uma oportunidade disponível para todos, de forma igualitária, justa e opcional.

Metodologicamente, foi realizada uma pesquisa bibliográfica definida por Gil (2007, p.44) como aquela que [...] é desenvolvida com base em material já elaborado, constituída principalmente de livros e artigos científicos. Assim, essa pesquisa envolveu o uso de leis, documentos, artigos e livros, buscando levar a autora e todos os possíveis leitores a compreender de maneira mais profunda o assunto em voga.

Após a escolha do tema, foi elaborado o Capítulo 1 - Introdução, apresentando os objetivos, justificativa e metodologia para realização do trabalho. Nos Capítulos 2 e 3 foram abordados diversos conceitos, leis e estudos realizados por alguns autores sobre o assunto escolhido. E nas Considerações Finais (Capítulo 4) foi feito uma síntese dos assuntos tratados no trabalho, seguida de uma consideração final sobre o tema e o alcance dos objetivos definidos inicialmente.

2 DIREITOS HUMANOS, DIREITOS FUNDAMENTAIS E O DIREITO À EDUCAÇÃO COMO UM DIREITO FUNDAMENTAL

2.1 A EDUCAÇÃO COMO DIREITO HUMANO

Não há dúvidas de que a educação é uma ferramenta que permite que as pessoas desenvolvam todos os seus atributos e habilidades para alcançar seu potencial como seres humanos e membros da sociedade. Ela está no centro do desenvolvimento pessoal e comunitário e sua missão é capacitar cada indivíduo, sem exceção, levando-o a desenvolver todos os seus talentos ao máximo e a realizar seu potencial criativo, incluindo a responsabilidade por suas próprias vidas e a conquista de seus objetivos pessoais.

Para compreender a importância da educação, Duarte (2007) repercute que a mesma é um direito humano que abrange os direitos civis e políticos, ou seja, um direito básico assegurado à todos os indivíduos, independentemente da cor, raça, classe social, gênero ou nacionalidade. Isso significa que os direitos humanos estão ligados a liberdade, igualdade, religião, cultura, recursos constitucionais e educação, estando positivados no plano internacional.

Segundo Mathias (2006) o direito à igualdade garante direitos iguais para todos os cidadãos. O Direito à Igualdade proíbe a desigualdade com base em casta, religião, local de nascimento, raça ou gênero. Também assegura a igualdade de oportunidades em questões de emprego público e impede o Estado de discriminar alguém em questões de emprego por motivos de religião, raça, casta, sexo, descendência, local de nascimento, local de residência ou qualquer um deles.

Por sua vez, o direito à liberdade fornece vários direitos como: liberdade de expressão, liberdade de reunião sem armas, liberdade de movimento em todo o território do país, liberdade de associação, liberdade de exercer qualquer profissão, liberdade de residir em qualquer parte do país. No entanto, esses direitos têm suas próprias restrições, diferente do direito contra a exploração, que condena o tráfico de pessoas, o trabalho infantil, o trabalho forçado, tornando-os um crime punível por lei, e também proíbe qualquer ato de obrigar uma pessoa a trabalhar sem salários, devido a existência do direito legal de trabalhar ou receber remuneração por isso, a menos que seja para fins públicos, como serviços comunitários ou trabalho de ONG; e seja uma opção individual e sem coerção.

O direito a recursos constitucionais, na concepção de Mathias (2006) garante que os cidadãos vão aos órgãos competentes para pedir execução ou proteção contra a violação de seus direitos fundamentais. O Supremo Tribunal, por exemplo, tem jurisdição para fazer valer os Direitos Fundamentais, mesmo contra órgãos privados e, em caso de violação, conceder indenização também ao indivíduo afetado.

E, por fim, há os direitos culturais e educacionais que protegem os direitos das minorias culturais, religiosas e linguísticas, permitindo-lhes conservar sua herança e protegendo-os contra a discriminação. Os direitos educacionais garantem educação para todos, independentemente de sua casta, gênero, religião, etc.

O artigo 26 da Declaração Universal dos Direitos Humanos bem como os principais tratados internacionais que garantem o direito à educação definiu os objetivos da educação que impactam no conteúdo da educação, nos processos e materiais de ensino e aprendizagem, no ambiente de aprendizagem e na própria aprendizagem.

O Pacto de São José da Costa Rica, por exemplo, estabelecido pelo Decreto N° 678, de 6 de novembro de 1992 e que promulga a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, em que os direitos econômicos, sociais e educacionais foram ampliados, fez com que uma convenção interamericana sobre direitos humanos determinasse a estrutura, competência e processo dos órgãos encarregados por esses direitos, em especial o da educação.

Todavia, a efetivação do direito à educação depende não apenas de institutos legais relacionados a essa temática e de estruturas governamentais capazes de promover o ensino, mas também de políticas sociais consistentes e do enfrentamento dos muitos desafios para que a educação realmente se torne um direito de todos e acessível aos diversos níveis da sociedade.

2.2 A EDUCAÇÃO COMO DIREITO FUNDAMENTAL

Tendo em mente que muitos dos Direitos Humanos são desconsiderados e/ou infringidos no contexto da realidade brasileira, é essencial refletir sobre a violação dos Direitos Fundamentais, que incluem todas as seções da Constituição que fornecem às pessoas direitos humanos básicos de todos os cidadãos, independentemente de gênero, casta, religião ou credo. etc. Desse modo, os Direito Fundamentais são os direitos reconhecidos e positivados na esfera do Direito Constitucional; com destaque para o princípio da Dignidade da Pessoa Humana, apontado por Moraes (2002, p. 50) da seguinte forma:

A dignidade da pessoa humana concede os direitos e garantias fundamentais, sendo inerentes as personalidades humanas. Esse fundamento afasta a ideia de predomínio das concepções transpessoalistas de Estado e Nação, em detrimento da liberdade individual. A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo vulnerável que todo o estatuto jurídico deve assegurar, de modo que somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício de direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas, enquanto seres humanos.

Quando a dignidade da pessoa humana é vetada, todos os outros princípios (liberdade, autonomia privada, cidadania, igualdade e solidariedade e outros princípios éticos) acabam sendo comprometidos.

Com isso, vê-se que o desrespeito aos princípios dos Direitos Humanos faz com que os direitos fundamentais abordados na Constituição Federal de 1988 acabem sendo violados, sendo que estes incluem:

1. Os Direitos individuais e coletivos: que estão ligados ao conceito de pessoa humana e à sua personalidade, tais como à vida, à igualdade, à dignidade, à segurança, à honra, à liberdade e à propriedade;

2. Os Direitos sociais: pois o Estado Social de Direito deveria garantir as liberdades positivas aos indivíduos, bem como a educação, saúde, trabalho, previdência social, lazer, segurança, proteção à maternidade e à infância e assistência aos desamparados, buscando a melhoria das condições de vida dos menos favorecidos e a igualdade social;

3. Os Direitos de nacionalidade: que envolvem o vínculo jurídico político que liga um indivíduo a um certo e determinado Estado, fazendo com que este indivíduo se torne um componente do povo, capacitando-o a exigir sua proteção e em contrapartida, o Estado sujeita-o a cumprir deveres impostos a todos;

4. E os direitos políticos: que abarcam a participação no estabelecimento ou administração de um governo e geralmente são detidos para habilitar o cidadão adulto a exercer a franquia, o exercício de cargos públicos e outras atividades políticas.

Nota-se, então, que como a educação é um direito humano e um bem público, os governos e outras autoridades públicas devem assegurar que um serviço de educação de qualidade esteja disponível gratuitamente para todos os cidadãos desde a infância até a idade adulta, a fim de que a educação alcance seu verdadeiro objetivo que é fornecer a base para a equidade na sociedade. Para tal, a educação deve ser priorizada pelo governo, pelas instituições de ensino e por toda a sociedade como um direito fundamental, como foi indicado no capítulo seguinte, afinal, todo indivíduo, independentemente de raça, gênero, nacionalidade, origem étnica ou social, religião ou preferência política, idade ou deficiência, tem direito a uma educação primária gratuita e esse direito foi universalmente reconhecido desde a Declaração Universal dos Direitos Humanos e até então foi consagrado em várias convenções internacionais, constituições nacionais e planos de desenvolvimento.

Lopes (2005) preconiza que a Declaração Universal dos Direitos Humanos não estabelece apenas o direito de acessar a educação, mas também a qualidade da educação ao afirmar que o ensino deve ser dirigido ao pleno desenvolvimento da personalidade humana e ao fortalecimento do respeito pelos direitos humanos e liberdades fundamentais. Além disso, deve promover compreensão, tolerância e amizade entre grupos diferentes, sendo importante trabalhar tanto para aumentar o acesso quanto à qualidade na educação e essencial para a promoção de outros direitos.

Desse modo, nota-se que a educação é um direito humano fundamental e primordial para o exercício de todos os outros direitos humanos, pois promove a liberdade e o empoderamento individuais e produz importantes benefícios de desenvolvimento. Isso significa que a educação é uma ferramenta poderosa pela qual adultos e crianças marginalizados econômica e socialmente podem sair da pobreza e participar plenamente como cidadãos.

E como a educação um dos serviços públicos mais básicos e de fundamental importância para minimizar as questões sociais como a pobreza extrema e desigualdades sociais, torna-se essencial compreender que todos os indivíduos têm direito ao conhecimento científico e que muitas são as possiblidades de transformações sociais que acontecem por meio da educação, tendo em mente que ela não apenas ilumina, mas também capacita os cidadãos e os habilita a contribuir ao máximo para o desenvolvimento social e econômico de suas comunidades.

2.3 ANÁLISE CRÍTICA DA EFETIVAÇÃO DO DIREITO À EDUCAÇÃO E A QUESTÃO DA INCLUSÃO

É preciso aqui destacar que o direito à educação não é apenas o direito de acesso à escola, mas também o direito de receber uma educação de boa qualidade. Mas para que isso aconteça, é de fundamental importância que a educação esteja disponível e acessível, mas seja também aceitável e adaptável. Além disso, Lopes (2005) afirma que a qualidade na educação está diretamente relacionada ao que os alunos aprendem, como aprendem e que benefícios extraem do processo de ensino-aprendizagem, o que faz com que a educação de qualidade seja um conceito dinâmico, que evolui com o tempo e que está sujeito a condições sociais, econômicas e ambientais.

Com base nisso, Costa (2016) entende que os desafios à efetivação de uma educação de qualidade acessível à todos incluem, principalmente: mudanças (e até mesmo uma perda) dos valores morais, éticos e sociais, bem como das crenças e costumes; falta de materiais didáticos de qualidade; capacitação dos profissionais envolvidos que deixa (e muito) a desejar (seja por uma ausência de programas de capacitação continuada, seja por insatisfação profissional); poucas oportunidades para o desenvolvimento profissional dos alunos; salas superlotadas; indisciplina; extrema desigualdade social; dentre outros.

Prova disso é que dentre os principais desafios (que acabam levando a todos os outros) destaca-se a falta de investimentos na educação pública, as regras de repasses realizados pelo Fundep (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento para a Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação); e a redução na verba repassada para as instituições de ensino. E para lidar com esses desafios, o primeiro passo apontado por Lopes (2005) é analisar a própria educação como responsabilidade do governo e uma política social opcional contextualizada no curso da reforma educacional brasileira na metade da década de 90, que requer outras tantas politicas sociais interligadas a estratégias que tenham como objetivo construir um sistema de ensino que se baseie:

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1. Nos direitos sociais em contextos sociais e econômicos;

2. Na busca pelo bem-estar de todos os indivíduos, com soluções de diversidade;

3. Nas preocupações específicas com os grupos de alunos vulneráveis, como os pobres, os deficientes e os grupos étnicos, os migrantes, as vítimas de desastres naturais; e os desempregados e idosos (no caso do Ensino de Jovens e Adultos EJA);

4. No apoio indireto à sustentabilidade e desenvolvimento dos alunos; e

5. No papel do Estado e sua administração;

6. E nas organizações sociais e suas práticas que ampliam o número de interessados no bem-estar e nas reformas do ensino.

Tais questões indicam que o conhecimento científico para efetivação da aprendizagem dos alunos é fundamental, uma vez que é o conhecimento que leva a promoção de projetos de pesquisa e trabalhos direcionados para as melhorias no desenvolvimento, na definição de padrões profissionais, na necessidade social e nos serviços assistenciais para tópicos específicos na área de ensino. E, com tudo isso, nota-se que muito precisa ser feito para que as oportunidades sejam aproveitadas e os desafios vencidos, por meio de políticas sociais realmente significativas, desenvolvidas e efetivadas pelo Estado, que apoiem os professores e gestores para a promoção de mudanças e que melhorem os resultados da educação.

O direito à educação, previsto no artigo 6º da Constituição Federal de 1988 como um direito fundamental de natureza social, vem detalhado no Título VIII, Da Ordem Social, especialmente nos artigos 205 a 214, dispositivos, nos quais se encontram explicitadas uma série de aspectos que envolvem a concretização desse direito, tais como os princípios e objetivos que informam os deveres de cada ente da Federação (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) para com a garantia desse direito, a estrutura educacional brasileira. (DUARTE, 2007).

Ainda que seja unanimidade que a educação seja um direito fundamental social, a mídia veicula com frequência questões sobre a aplicação desse direito, mesmo que a essência da Constituição Federativa do Brasil esteja preservada. Dessa forma, a educação estabelecida na Carta Magna ampara a todos os cidadãos, mas perante a sociedade existem dúvidas da aplicação desse direito os diferentes níveis educacionais como previstos na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de 1996, que compreende a educação básica e a educação superior.

O Capítulo III do Título VIII, intitulado Da Educação, da Cultura e do Desporto, Seção I, da Constituição Federal, prevê em seu artigo 209 a participação da iniciativa privada conforme seus incisos: (I) Cumprimento das normas gerais da educação nacional (II) autorização e avaliação de qualidade pelo poder público; assim como artigo 206 inciso VII também da Constituição, determina que a educação é dever do estado e está efetivado mediante garantia de acessos aos níveis mais elevados de ensino, da pesquisa, da criação artística, segundo a capacidade de cada um.

Com base nisso nota-se que, no caso da criança autista, os mesmos institutos legais são válidos, devendo ser assegurado à mesma direitos civis e políticos e direitos econômicos, sociais e culturais; que incluem os direitos estabelecidos em instrumentos anteriores, bem como o novo conjunto de direitos, como os relativos à acessibilidade, mobilidade ou habilitação pessoal e reabilitação, além de introduzir novos tópicos, como a identificação de pessoas com deficiência, o conceito de acomodações razoáveis ​​e da obrigação de todos os envolvidos direta ou indiretamente cooperarem no campo da deficiência.

O grande problema é que, mesmo com todos os respaldos legais e busca pela promoção da inclusão nas escolas regulares, Nascimento (2006) esclarece que o que se entende é uma falta de percepção do que é verdadeiramente a Educação Inclusiva, pois governo e escola tem buscado levar crianças que necessitam de um atendimento especializado às classes comuns sem o acompanhamento do professor especializado; ignorado as necessidades específicas da criança; fazendo essas crianças seguirem um processo único de desenvolvimento, ao mesmo tempo e para todas as idades; extinguindo o atendimento de educação especial antes do tempo; e, para piorar, esperam que os professores de classe regular ensinem as crianças portadoras de necessidades especiais sem qualquer tipo de suporte técnico.

Dessa forma, percebe-se que as escolas que não estão atendendo os alunos com deficiência em suas turmas regulares, especialmente as instituições públicas, se justificam, na maioria das vezes, pelo despreparo dos seus professores e dos orientadores pedagógicos para esse fim; e que as escolas que fazem esse atendimento não têm condições para promover a inclusão. Existem também as que não acreditam nos benefícios que esses alunos poderão tirar da nova situação, especialmente os casos mais graves, pois não teriam condições de acompanhar os avanços dos demais colegas, seriam ainda mais marginalizados e discriminados do que nas classes e escolas especiais (MANTOAN, 2001).

Por isso, algumas ações são primordiais para que se possa transformar a escola em direção a um ensino de qualidade e inclusivo como: colocar a aprendizagem como o eixo das escolas, porque escola foi feita para fazer com que todos os alunos aprendam; garantir tempo para que todos possam aprender e reprovar a repetência; abrir espaços para que a cooperação, o diálogo, a solidariedade, a criatividade e o espírito crítico sejam exercitados nas escolas; estimular através da formação continua e valorização do corpo docente que é responsável pela tarefa fundamental da escola: a aprendizagem e o desenvolvimento dos alunos; e elaborar planos de cargos e aumentar salários, realizar cursos públicos de ingresso, acesso e renovação do corpo docente.

Mantoan (2001) recomenda ainda que para melhorar as condições pelas quais o ensino é ministrado nas escolas, deve-se universalizar a inclusão de todos nas turmas regulares; e propor-se uma formação que se baseie em princípios educacionais construtivistas, reconhecendo que a cooperação, a autonomia intelectual e social, a aprendizagem ativa são condições que propiciam o desenvolvimento global de todos os alunos, assim como a capacitação e aprimoramento profissional do corpo docente.

A autora supracitada finaliza recomendando que, para tornar possível a inclusão, é necessário formar parcerias (professores, alunos, orientadores, escolas, profissionais, áreas correlatas e universidades) para que se possa manter ativa e capaz de fazer frente a inúmeras solicitações que esta modalidade de trabalho provoca nos interessados. Esses profissionais precisam refletir sobre uma educação de qualidade para que todos compreendam a importância da mesma e para que haja:

Reconhecimento e valorização da diversidade como elemento enriquecedor do processo de ensino e aprendizagem;

Professores conscientes do modo como atuam para promover a aprendizagem de todos os alunos;

Cooperação entre os implicados no processo educativo dentro e fora da escola;

Valorização do processo sobre o produto da aprendizagem;

Enfoques curriculares metodológicos e estratégias pedagógicas que possibilitam a construção coletiva do conhecimento.

Contudo, de nada adianta fazer tudo isso, na visão de Nascimento (2006), se a inclusão escolar, especialmente em escolas públicas, continuar gerado discussões e controversas, fazendo com que a Educação Especial passe por momentos críticos em todas as estâncias que permeiam: conceitual, nos aspectos das divergências, no aspecto da atribuição de competências, no aspecto da transição do modelo pedagógico, no aspecto da construção da prática pedagógica, no aspecto qualidade docente, no aspecto da educação para o trabalho e no fenômeno da globalização.

No entanto, deve-se entender como é a Educação Inclusiva na sua totalidade, inclusive em instituições de ensino particulares, pois a mesma pode tornar-se excludente e marcada pelo fracasso e pela evasão de uma parte significativa de seus alunos, que são marginalizados pelo insucesso, seja por privações constantes e pela baixa autoestima resultante da exclusão escolar e social, seja porque o aluno inclusivo pode acabar sendo vítima de seus pais, de seus professores e, sobretudo, das condições em que vivem, em todos os seus sentidos (MANTOAN, 2001).

Assim, Nascimento (2006) manifesta que um dos grandes desafios que se colocam ante à escola inclusiva, principalmente nas instituições públicas de ensino envolve a preparação, interação e conscientização da equipe pedagógica, bem como na formação, participação e formação de professores, pois ainda que se façam programas de formação mais significativos para uma qualificação maior desses profissionais, é preciso que eles não só tenham total capacitação para lidar com alunos com NEE, mas que tenham prazer de fazer isso, coisa que não tem acontecido nem mesmo no processo de ensino-aprendizagem com alunos normais.

E como na opinião de Sassaki (1997), uma escola regular não se torna automaticamente uma escola inclusiva só porque admitiu alguns alunos com deficiência nas classes regulares, entende-se que uma escola regular, seja ela pública ou privada, só se torna inclusiva depois que se reestruturou para atender a diversidade do novo aluno em termos de necessidades especiais, não só as decorrentes de deficiência física, mental, visual, auditiva ou múltipla, como também aquelas resultantes de outras condições atípicas, em termos de estilos e habilidades de aprendizagem dos alunos e em todos os outros requisitos do princípio da inclusão estabelecidos na Declaração de Salamanca.

No caso da criança autista, mesmo considerando que a mesma tem grandes chances de sucesso, principalmente em instituições particulares preparadas para o atendimento do autismo, é preciso levar em consideração que muitos autistas simplesmente não conseguem se adaptar a ambientes com muito barulho, muita gente, muita atividade, etc,; e, por isso, a educação domiciliar, em um ambiente já conhecido pelo autista, lhe dá sensação de segurança, se apresentando como uma hipótese melhor e, provavelmente com um custo similar ao da educação fornecida pelas escolas particulares.

Assim, no presente capítulo foi possível verificar que a educação é um Direito humano e fundamental e de enorme importância para o desenvolvimento da pessoa humana, de forma digna e na formação de uma cidadania mais qualificada, bem como para melhor habilitar o indivíduo ao exercício mais amplo e consciente de suas liberdades individuais. Entretanto, o processo de educação pode ocorrer não apenas em uma instituição de ensino, mas em casa, se a metodologia for bem estabelecida e com estratégias definidas adequadamente.

Nesse sentido, é essencial analisar o sistema de educação obrigatória, apontada por Freitas (2015) como tal pelo fato de o Estado ter o dever de fornecer ensino gratuito e de qualidade para todos e instituir que os pais ou responsáveis são compelidos a matricularem e conservarem seus filhos nas escolas, sejam públicas ou privadas, para que recebam os serviços de educação básica. Assim, vale aqui citar que

Atualmente, a obrigatoriedade estaria para crianças de 6 (seis) a 14 (quatorze) anos, no ensino fundamental e dos 15 (quinze) aos 17 (dezessete), no ensino médio. Mas a obrigatoriedade também alcançará, a partir de 2016, as crianças de 4 (quatro) a 5 (cinco anos), no chamado ensino infantil, quando entram em vigor as alterações à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (lei n. 9.394/96) trazidas pela lei n. 12.796/132. Essa lei, por sua vez, veio para regulamentar a Emenda Constitucional n. 59 de 2009, que alterou, dentre outros, o inciso I do art. 208 passando a asseverar cumprir ao Estado fornecer, gratuita e obrigatoriamente, acesso à educação básica dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade. Com isso, tem-se entendido que os pais ou responsáveis que não mantém seus filhos/pupilos devidamente matriculados em instituições de ensino, públicas ou privadas, estariam cometendo o crime de abandono intelectual, previsto no artigo 246 do Código Penal Brasileiro (FREITAS, 2015, p.02).

Todavia, mesmo a educação sendo um direito fundamental e de todas as considerações brasileiras instituem a educação escolar como imperativa e imprescindível para socialização da criança e do adolescente, é preciso considerar que o crime de abando intelectual, caso os pais optem pelo ensino em casa, não deveria existir, uma vez que, se o artigo 205 da Constituição Federal de 1988 estabelece que a educação é direito de todos e dever do Estado e da família, os pais deveriam ter [...] o direito e a competência de decidir educar seus filhos fora da escola, em casa, por não concordarem com o sistema adotado pelas Escolas Públicas (ou privadas) [...] (FREITAS, 2015, p. 03). Da mesma maneira, os artigos 227 e 229 da Carta Magna, instituem como dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, dentre outros, o direito à educação, mostrando que os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores.

Baseado nisso, percebe-se que a família deve ter a oportunidade de verificar qual o melhor caminho para melhorar a vida de seus filhos, inclusive das crianças acometidas do espectro autista, ponderando se os ambientes escolares públicos e particulares podem ser ou não a melhor indicação para os indivíduos com essa peculiaridade, avaliando se haveria outras possibilidades de se prover o direito à educação, de forma mais adequada para essas pessoas e averiguando se o homeschooling não seria uma dessas possibilidades, que é o que se pretende analisar a seguir, juntamente com um exame completo sobre o direito especificamente para o autista.

3 DIREITO À EDUCAÇÃO ESPECIFICAMENTE PARA O AUTISTA

De modo geral, aqueles que apoiam a inclusão reconhecem que os alunos têm diversas necessidades de aprendizagem e que o modelo tradicional de educação não é capaz de acomodar todos esses alunos, mesmo as instituições de ensino sendo ambientes de suma importância para promover a inclusão. Um desses alunos que precisam ser incluídos é o aluno com autismo, que tem ganhado cada vez mais espaço na atualidade, fomentando pesquisas nas mais diversas esferas, por se tratar de um distúrbio de desenvolvimento que acompanha o indivíduo por toda sua vida e pelo fato de seus sintomas estarem associados à comunicação, interação social e comportamento que podem ser observados no início da infância, aproximadamente à partir dos 3 anos de idade (SASSAKI, 1991).

Ferreira (2011) informa que o autismo é um distúrbio do desenvolvimento que afeta os comportamentos e as habilidades de comunicação; e que os sintomas variam de leve a grave, geralmente, dificultando o envolvimento com os outros e requerendo novas diretrizes para categorizar o autismo por nível. Esses níveis substituíram outros distúrbios do desenvolvimento neurológico que compartilhavam sintomas com o autismo, como a síndrome de Asperger. Com base nisso, atualmente, existem três níveis no Transtorno do Espectro Autismo - TEA, cada um refletindo um nível diferente de apoio que alguém pode precisar, indicando que pessoas com autismo de nível 1 apresentam sintomas leves e podem não exigir muito apoio. Já aqueles com autismo de nível 2 ou 3 apresentam sintomas moderados a graves e requerem apoio mais substancial.

As pessoas com autismo de nível 1, conforme Silvia (2011) têm problemas visíveis com as habilidades de comunicação e socialização com os outros. Elas geralmente podem conversar, mas pode ser difícil mantê-la por muito tempo, achando difícil entrar em contato e fazer novos amigos. Os principais sintomas são: interesse diminuído em interações ou atividades sociais; dificuldade em iniciar interações sociais, como conversar com uma pessoa; capacidade de se envolver com uma pessoa, mas pode ter dificuldade para manter o diálogo comum de uma conversa típica; sinais óbvios de dificuldade de comunicação; dificuldade em se adaptar a mudanças na rotina ou no comportamento; e dificuldade em planejar e organizar.

Enquanto os indivíduos com autismo de nível 1 geralmente mantêm uma alta qualidade de vida com pouco apoio, aqueles com autismo de nível 2 requerem suporte substancial, já que ps sintomas associados a esse nível incluem uma falta mais grave de habilidades de comunicação verbal e não verbal, o que dificulta as atividades diárias, pois a pessoa tem problemas para lidar com mudanças na rotina ou nos arredores e apresenta resposta incomum ou reduzida a sugestões sociais, comunicação ou interações. Mesmo com o suporte, o autista nesse grau pode ter dificuldade em se adaptar às mudanças em seu ambiente e uma variedade de terapias pode ajudar, como é o caso da terapia de integração sensorial.

O nível mais grave de autismo revelado por Silvia (2011) é o 3, uma vez que aqueles que estão nesse nível exigem suporte muito substancial. Além de uma falta mais severa de habilidades de comunicação, pessoas com autismo de nível 3 também apresentam comportamentos repetitivos ou restritivos. Os comportamentos repetitivos se referem a fazer a mesma coisa repetidamente, seja uma ação física ou falando a mesma frase; e os comportamentos restritivos são aqueles que tendem a distanciar alguém do mundo ao seu redor. Isso pode envolver uma incapacidade de se adaptar à mudança ou restringir interesses em tópicos muito específicos.

Dessa forma, o autista de grau 3 apresenta: falta visível de habilidades de comunicação verbal e não verbal, desejo muito limitado de se envolver socialmente ou participar de interações sociais, problemas em mudar comportamentos, extrema dificuldade de lidar com mudanças inesperadas na rotina ou no ambiente e grande angústia ou dificuldade em mudar o foco ou atenção.

Nesse caso, é importante aqui declarar que o Transtorno do Espectro Autista (TEA), assim como a educação inclusiva e o direito da criança autista de acesso ao ensino púbico regular, reúne um número considerável de publicações, contudo, o número de trabalhos envolvendo crianças autistas ainda carece de maiores aprofundamentos, principalmente no que se refere aos graus leve, moderado e severo do autismo e possibilidade da criança ser instruída em casa, longe dos holofotes do ensino escolar público ou privado.

Desse modo, nota-se que há muitas controvérsias sobre a adequação da inclusão para estudantes com autismo, sendo que grande parte dessa controvérsia baseia-se em diversas interpretações das leis e do pensamento atual, principalmente sobre a obrigatoriedade do ensino regular quando se trata da criança autista, inclusive as consideradas com grau severo, que apresentam maior dificuldade de socialização e aprendizagem em grupo. E como muitas das premissas básicas do conceito de inclusão são muitas vezes ignoradas nessas discussões, isso leva muitos pais, escolas e pessoas da sociedade a terem dificuldades para lidar com uma criança autista, tendo em vista que esta pode apresentar, segundo Silvia (2011): traços de agressividades, hábitos repetitivos, dificuldade de interagir com outras crianças/adultos, desconforto ou desinteresse em momentos de comunicação, dentre outros.

Pensando nisso, entende-se que todos os que se relacionam com um autista devem ter uma abordagem adequada e eficiente, para que o indivíduo com autismo consiga se desenvolver durante sua vida acadêmica e social, seja dentro de casa ou por meio de um ensino em casa adequado às necessidades da criança com TEA. E ainda que nada disso seja uma tarefa fácil, é possível se pressupor que o estudo sobre o autismo possibilita a aquisição de novos conhecimentos e informações sobre o assunto, levando à compreensão da importância da inclusão escolar de um aluno autista, bem como da identificação de procedimentos pedagógicos que facilitem a interação e o aprendizado da criança autista dentro de casa, como mostrado abaixo.

3.1 O HOMESCHOOLING COMO FORMA DE SE GARANTIR O DIREITO FUNDAMENTAL PARA O AUTISTA

As legislações estrangeiras têm buscado enfatizar o Homeschooling (ensino em casa), tornando-o um movimento progressivo, no qual os pais escolhem educar seus filhos em casa, em vez de enviá-los para uma escola pública ou privada tradicional. As famílias escolhem o ensino em casa por várias razões, incluindo insatisfação com as opções educacionais disponíveis, diferentes crenças religiosas ou filosofias educacionais e a crença de que as crianças não estão progredindo dentro da estrutura escolar tradicional.

O movimento de educação em casa começou a crescer na década de 1970, quando alguns autores e pesquisadores populares, como John Holt e Dorothy e Raymond Moore, começaram a escrever sobre reforma educacional. Eles sugeriram o ensino em casa como uma opção educacional alternativa. De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisa em Educação Doméstica (apud COSTA, 2016), agora existem mais de dois milhões de crianças em idade escolar em casa nos EUA, com a porcentagem aumentando rapidamente de 7% a 15% a cada ano. O ensino em casa é legal em todos os 50 estados e em muitos países estrangeiros.

São José (2014) menciona que os requisitos legais para o ensino em casa nos EUA variam de um lugar para outro. Alguns estados têm poucos ou nenhum requisito; outros pedem revisões do portfólio ou testes padronizados em determinados intervalos. Em quase todas as áreas do país, os pais não precisam de um diploma de educação escolar em casa. Aqueles com crianças pequenas que nunca frequentaram uma sala de aula tradicional podem iniciar um programa de educação em casa quando o filho completar a idade escolar. Nesse momento, eles começarão a aderir aos requisitos em seu Estado específico.

O processo é um pouco diferente para os pais que já têm filhos na escola e depois decidem fazer o ensino em casa. Eles devem primeiro escrever uma carta de retirada ao diretor da escola ou ao superintendente local. A carta deve descrever a intenção dos pais de remover uma criança da escola para começar a estudar em casa. Após a notificação, os pais continuam a seguir as diretrizes específicas de seu distrito.

3.1.1 O homeschooling no Brasil

No caso brasileiro, o ensino em casa não é uma prática comum e cria polêmica cada vez mais intensas, já que a maioria dos pesquisadores, educadores e pais acreditam que o sistema educacional do país, apesar de suas complexidades e limitações, oferece grandes oportunidades para as crianças aprenderem novas informações e habilidades, além de aproveitar suas próprias qualidades e interesses únicos. Por sua vez, o ensino em casa é considerado uma proposta de educação pouco eficiente no país, pois envolve uma mudança importante no estilo de vida para a qual considera-se que os brasileiros não estão preparados.

Com isso, em 2018 o STF (Supremo Tribunal Federal) julgou que, por falta de lei, o ensino domiciliar não é um meio lícito para que pais garantam aos filhos o acesso à educação, como mostrado à seguir:

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) negou provimento ao Recurso Extraordinário (RE) 888815, com repercussão geral reconhecida, no qual se discutia a possibilidade de o ensino domiciliar (homeschooling) ser considerado como meio lícito de cumprimento, pela família, do dever de prover educação. Segundo a fundamentação adotada pela maioria dos ministros, o pedido formulado no recurso não pode ser acolhido, uma vez que não há legislação que regulamente preceitos e regras aplicáveis a essa modalidade de ensino. O recurso teve origem em mandado de segurança impetrado pelos pais de uma menina, então com 11 anos, contra ato da secretária de Educação do Município de Canela (RS), que negou pedido para que a criança fosse educada em casa e orientou-os a fazer matrícula na rede regular de ensino, onde até então havia estudado. O mandado de segurança foi negado tanto em primeira instância quanto no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS). Para a corte gaúcha, inexistindo previsão legal de ensino na modalidade domiciliar, não haveria direito líquido e certo a ser amparado no caso (BRASIL, 2018, p.01.

O relator do RE mencionado, ministro Luís Roberto Barroso, votou no sentido do provimento do recurso, pois ele considerou constitucional a prática do ensino domiciliar, em virtude da sua compatibilidade com as finalidades e os valores da educação infanto-juvenil, expressos na Constituição de 1988. Em seu voto, Barroso propôs algumas regras de regulamentação da matéria, mas o ministro Alexandre de Moraes abriu a divergência no sentido do desprovimento do recurso e foi seguido pela maioria dos ministros, pois segundo eles, o texto constitucional visou colocar a família e o Estado juntos para alcançar uma educação cada vez melhor para as novas gerações, por essa razão, dentre as formas de ensino domiciliar [...] a chamada espécie utilitarista, que permite fiscalização e acompanhamento, é a única que não é vedada pela Constituição (BRASIL, 2018, p.01).

Isso porque o ensino domiciliar, na concepção da maioria dos ministros do STF requer não apenas os deveres e responsabilidades de um professor e administrador, bem como a implementação de lições, organizar excursões, coordenar atividades com outros pais e garantir que esteja em conformidade com os requisitos das escolas domésticas, o que não é comum no Brasil. Além disso, poucos pais e responsáveis têm condições de arcar com os custos financeiros adicionais do ensino em casa, pois os recursos gratuitos disponíveis no país, como materiais escolares, livros didáticos e materiais de arte, quando são disponibilizados, isso ocorre apenas nas escolas públicas.

Computadores, softwares e outras ferramentas para o ensino domiciliar também são custos adicionais que muitos pais não têm como arrostar, o que indica que muitos pais não podem escapar ao fato de que, ao dedicar mais tempo ao ensino dos filhos em casa, a família pode sofrer uma perda de renda. E como a criança não estará mais em um ambiente de escola pública e todo o aprendizado ocorrerá em casa, o estilo de vida e o ritmo da família mudarão, fazendo com que tarefas diárias, recados, consultas médicas e rotinas domésticas típicas precisem ser agendadas em coordenação com o plano de educação em casa. Por essa razão, nota-se se compreensível a opinião da ministra Rosa Weber que

[...] lembrou que enquanto a Constituição de 1946 previa que a educação dos filhos se dava no lar e na escola, a Carta de 1988 impôs um novo modelo, consagrado entre outros no artigo 208 (parágrafo 3º), segundo o qual compete ao Poder Público recensear os educandos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela frequência à escola. Esse modelo, segundo a ministra, foi regulamentado no plano infraconstitucional por meio da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que falam na obrigatoriedade dos pais em matricularem seus filhos na rede regular de ensino. A ministra salientou que o mandado de segurança impetrado na instância de origem discute basicamente a legislação infraconstitucional, que obriga os pais a procederem à matrícula dos filhos na rede regular de ensino. E nesse aspecto, a ministra disse que não existe espaço para se conceder o pedido de homeschooling. O ministro Luiz Fux também divergiu do relator e votou pelo desprovimento do recurso. Mas, em seu entendimento, há inconstitucionalidade do ensino domiciliar em razão de sua incompatibilidade com dispositivos constitucionais, dentre eles os que dispõem sobre o dever dos pais de matricular os filhos e da frequência à escola, e o que trata da obrigatoriedade de matrícula em instituições de ensino. Fux citou ainda dispositivos da LDB e do ECA que apontam no mesmo sentido, e até mesmo o regulamento do programa Bolsa Família, que exige comprovação de frequência na escola para ser disponibilizado. O ministro apontou ainda a importância da função socializadora da educação formal, que contribui para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho. (BRASIL, 2018, p.02).

Baseado nisso, outro fator a ser considerado é que o ensino em casa significa menos interação diária com crianças na mesma faixa etária, o que faz com que as crianças em casa acabem gastando menos tempo todos os dias participando de esportes e atividades organizadas com seus colegas; e isso não significa que essas crianças não tenham a capacidade ou gostem de praticar esportes ou interagir socialmente com outras pessoas fora de sua família.

Por esses motivos, o Ministro Ricardo Lewandowski discorda do homeschooling no Brasil, acreditando que a legislação brasileira é clara quanto ao assunto, afastando a possiblidade de individualização do ensino no formato domiciliar; da mesma forma que o Ministro Gilmar Mendes destaca que a adoção do ensino domiciliar traria complexidades para o sistema de ensino, uma vez que exigiria a instituição de uma política de fiscalização e avaliação; e o Ministro Marco Aurélio aponta que a realidade normativa educacional brasileira não permite interpretações extravagantes.

Enfim, o Ministro Dias Toffoli, também negando provimento ao recurso, disse que na realidade brasileira é difícil constatar, de imediato, a existência de direito líquido e certo que justificasse o provimento do recurso; e a Ministra Cármen Lúcia ressaltou as premissas do relator relativas à importância fundamental da educação, aos problemas relativos a ela na sociedade brasileira e ao interesse dos educandos como centro da discussão. Com isso, na ausência de um marco normativo específico que possa garantir o bem-estar da criança, a ministra votou por negar provimento ao recurso extraordinário, sem discutir a constitucionalidade do instituto.

Assim, entende-se que a modalidade só pode ser legitimada se houver norma que determine suas diretrizes, seguindo preceitos e regras que incluam cadastramento dos alunos, avaliações pedagógicas e de socialização e frequência, até para que se evite uma piora no quadro de evasão escolar disfarçada sob o manto do ensino domiciliar. E nesse sentido, Freitas (2015, p. 06) aponta que, ao fazer uma interpretação literal, restritiva e isolada dos dispositivos legais atuais

[...] certamente se afigura bastante clara e evidente a intenção do legislador e a vontade ou o espírito da lei. Afinal, os textos legais são expressos em impor o dever (art. 6º da LDB) e a obrigação (art. 55 do ECA), aos pais ou responsáveis, de matricular as crianças, seus filhos ou pupilos, dos quatro aos dezessete anos na rede regular de ensino. Diante dessa literalidade, o entendimento doutrinário e jurisprudencial tem sido o de que a educação seria um direito das crianças em idade escolar e, para que estas exerçam tal direito, uma obrigação e um dever do Estado, em fornecer escolas públicas gratuitas e dos pais ou responsáveis de matricular e manter matriculados seus filhos ou pupilos crianças nas escolas, públicas ou particulares [...] E como não há nenhuma sanção prevista nos dispositivos constitucionais, da LDB ou do ECA, caso os pais ou responsáveis não matriculem ou não mantenham matriculados seus filho ou pupilos na rede de escolas de ensino básico, buscou-se estender, ao Código Penal e ao Código Civil tal intenção..

Especificamente quando o assunto envolve as crianças com autismo, as dificuldades de efetivação do ensino em casa são ainda maiores, tendo em vista que a maioria das legislações atuais apresenta o direito de acesso a escolarização pública regular para esse público como uma obrigatoriedade e não como uma possibilidade, como pode ser visto à seguir, no artigo 4º da Lei Nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional: I - educação básica obrigatória (grifo nosso) e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, organizada da seguinte forma: a) pré-escola; b) ensino fundamental; c) ensino médio (Incluído pela Lei nº 12.796, de 2013).

Como a Síndrome de Autismo trata-se de uma disfunção global do desenvolvimento relativamente nova, com pouco tempo de discussão e estudos escassos; tornando essencial verificar como o processo de inclusão desses alunos tem sido realizado nas instituições de ensino brasileiras, de um modo geral, de forma a analisar a realidade atual desses alunos, das escolas e dos educadores e propor melhorias para que o processo de ensino-aprendizagem inclusivo seja realmente efetivo e eficaz, respondendo a questões como: a Educação para esse público realmente deve ser obrigatória? Essa obrigatoriedade deveria ser para quem e em que sentido? Ou a educação em escolas regulares é um Direito à ser assegurado e não imposto? Novamente, para quem e em que sentido? (FREITAS, 2015).

Além disso, é preciso levar em consideração o fato de que a inclusão de crianças autista no ensino regular, principalmente das instituições públicas, ainda está muito longe do que deveria ser, seja pela falta de infraestrutura governamental e escolar, seja por fatores como: despreparo da equipe pedagógica, falta de participação da família, ausência de um acompanhamento especializado, dentre outros, principalmente quando o grau do autismo da criança é moderado ou severo, indicando que é importante ter em mente que uma das vantagens do ensino em casa é que os alunos autistas podem progredir de acordo com seu próprio temperamento e horário.

Nesse sentido, Costa (2014) relata que educar em casa uma criança com autismo é assegurar que ela está recebendo o que precisa e quando precisa, pois dá a flexibilidade de individualizar verdadeiramente um programa que melhor atenda às suas necessidades diárias e semanais. Prova disso é que alguns programas de autismo nas escolas domésticas permitem ajustar o currículo para melhor se adequar às habilidades de aprendizado dos alunos e fornecem informações que, com sorte, responderão à muitas das perguntas iniciais que se têm sobre educar em casa uma criança com autismo.

Em termos de educação em casa, São José (2016) cita que os tipos de autismo são muito pouco; por isso quase todas as crianças do espectro podem se beneficiar da abordagem personalizada que a educação em casa oferece. No entanto, se a criança faz parte do espectro da Síndrome de Asperger, as opções de currículo podem diferir amplamente de criança para criança.

Caso o indivíduo seja diagnosticado com "autismo atípico", este costuma ser caracterizado por desenvolvimento desigual de habilidades (pontos fortes em algumas áreas e atrasos em outras). Assim, a escolher o melhor currículo para esse tipo de autismo, os alunos com Transtorno Pervasivo do Desenvolvimento têm pontos fortes e fracos que devem ser levados em consideração.

De modo geral, Costa (2014) informa que quando a criança tem TEA, as opções educacionais não são tão simples, por isso, ao pensar na educação infantil e as necessidades especiais do indivíduo, os responsáveis tem o direito de considerar se a escola ou a escola em casa é a opção certa, levando em conta que muitos professores não têm treinamento especial em distúrbios do espectro do autismo e que a maioria das crianças não está preparada para passar longas horas parada e ouvindo, principalmente se os planos de aula não forem modificados para acomodar as necessidades especiais de aprendizado.

Dessa maneira, entende-se que, apesar da escola pública parecer a melhor opção para algumas famílias (em especial as menos favorecidas), para outras o ensino em casa pode ser a escolha ideal, tendo em vista que o homeschooling geralmente propõe a utilização de programas que funcionam com um estilo de aprendizado espacial visual, usa formatos e padrões previsíveis, incorpora as novas metodologias, assegura ferramentas de aprendizado e a tecnologia assistida, que podem fazer toda a diferença, garante a abordagem de estratégias conhecidas para melhor auxiliar os alunos com autismo, promove a flexibilidade e a liberdade de mudar a abordagem de ensino, ajusta o currículo que melhor funcione para aa criança com TEA e, ainda, cria e reforça as habilidades de leitura usando um ambiente on-line interativo.

Além disso, muitas famílias levam em consideração não apenas estes aspectos formais e específicos dos instrumentos e formas de ensino, mas também o fator ambiente, tendo em vista que o ambiente em uma escola ideal, muito bem equipada, limpa e preparada já seria temerário para muitos autistas; quem dirá de eventuais escolas que funcionam em prédios mau cuidados, com equipamentos e estrutura precárias; pessoal, professores e funcionários sem a devida preparação específica para lidar com um autista; currículos defasados; etc. Nesse sentido, entende-se a clara vantagem da educação domiciliar, pois, neste aspecto o ambiente melhor para o autista é aquele com o qual ele tem familiaridade e se sente seguro.

Compreende-se, então, que de muitas maneiras, o ensino em casa diminui a incidência de alguns sintomas que o autista apresenta, pelo fato do mesmo estar em um ambiente com o qual tem maior familiaridade. E como o ensino em casa pode continuar até que um aluno se forme e entre na faculdade, percebe-se que as famílias podem optar por estudar em casa ao longo da educação de seus filhos autistas, ou podem fazê-lo por apenas alguns anos até notar ser adequado transferir a criança com TEA para o sistema escolar convencional.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Quando uma criança com autismo atinge a idade escolar, os pais se perguntam como oferecer o melhor programa educacional possível para seu filho com necessidades especiais. Existem várias opções, sendo elas: educação pública, escola particular ou educação em casa, sendo essa última incomum no Brasil, por isso, os pais acabam optando por uma educação pública por várias razões, dentre as quais destacam-se: a socialização com outras crianças, o ensinamento e a obrigatoriedade imposta pelo governo em seus institutos legais.

Todavia, muitas vezes, a realidade é que as aulas geralmente são extensas e cansativas para o autista, o professor não tem tempo ou disposição para prestar uma atenção especial nem para o aluno autista nem aos demais estudantes, e o educador, principalmente nas escolas públicas, pode não ter treinamento especial em distúrbios do espectro do autismo e o tempo de auxílio pessoal é limitado, se houver. Com isso, os planos de aula não são modificados especificamente para acomodar necessidades especiais de aprendizado.

Outro problema é que a maioria das escolas públicas não tem os recursos necessários para fornecer uma educação sólida para uma criança com autismo, sendo nítida a falta de uma equipe treinada profissionalmente, assessores de professores ou equipamento especial, como um laptop, que pode ser benéfico para crianças que têm dificuldades com o controle motor, pois elas costumam achar mais fácil digitar do que escrever à mão. Muitas crianças autistas gostam de trabalhar em computadores, mas isso é quase impossível no ensino regular público.

Sobre as autoras
Natália Cardoso Marra

Orientadora, Advogada, Professora, Doutora em Ciências Sociais pela PUC Minas; Mestre em Gestão Social e Desenvolvimento Local pelo Centro Universitário UNA; Pós-graduada em Direito Ambiental pela Faculdade Gama Filho; Pós-graduada em Administração Pública e Gestão Urbana pela IEC/PUC Minas; Pós-graduada em Justiça Restaurativa e Práticas Circulares pela IEC/PUC Minas; Graduada em Direito pela Milton Campos, OAB/MG 117.356.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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