Medidas Provisórias relacionadas aos setores de turismo, cultura e da aviação civil brasileira, em razão da pandemia de coronavírus (covid-19)

19/04/2020 às 19:09
Leia nesta página:

Em decorrência da pandemia provocada pelo coronavírus (covid-19), o Presidente da República editou algumas Medidas Provisórias, que estão em vigor (2020) para diminuir o impacto econômico causado pelo isolamento social. Entenda do que se trata.

1. ESTADO DE CALAMIDADE PÚBLICA:

O Decreto Legislativo nº 6 de 2020, foi aprovado pelo Congresso Nacional, e reconheceu, a ocorrência do estado de calamidade pública, nos termos da solicitação do Presidente da República, encaminhada por meio da Mensagem nº 93/2020[1], para os fins do art. 65, da LC 101/2000 (onde está prevista a hipótese de calamidade pública na lei), que dispõe o seguinte:

 

 Art. 65. Na ocorrência de calamidade pública reconhecida pelo Congresso Nacional, no caso da União, ou pelas Assembléias Legislativas, na hipótese dos Estados e Municípios, enquanto perdurar a situação:

I - serão suspensas a contagem dos prazos e as disposições estabelecidas nos arts. 23 , 31 e 70;

II - serão dispensados o atingimento dos resultados fiscais e a limitação de empenho prevista no art. 9o.

Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput no caso de estado de defesa ou de sítio, decretado na forma da Constituição.

 

Portanto, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LC 101/2020) prevê que, decretado o estado de calamidade, ficam suspensos os prazos para ajuste das despesas de pessoal e dos limites do endividamento para cumprimento das metas fiscais e para adoção dos limites de empenho (contingenciamento) das despesas.

 

Segundo o governo, o reconhecimento do estado de calamidade pública, previsto para durar até 31 de dezembro, é necessário “em virtude do monitoramento permanente da pandemia covid-19, da necessidade de elevação dos gastos públicos para proteger a saúde e os empregos dos brasileiros e da perspectiva de queda de arrecadação”.[2]

 

Assim, o decreto de calamidade pública, vai permitir que o governo federal gaste mais do que o previsto e desobedeça às metas fiscais para custear ações de combate à pandemia. Com isso, o rombo nas contas públicas poderá ser superior a R$ 124,1 bilhões, meta fiscal para o governo central definida no Orçamento para este ano (2020). – (Fonte: Agência Senado Federal)

Além disso, o Decreto Instituiu a Comissão Mista no âmbito do Congresso Nacional, que poderão ter seus trabalhos desenvolvidos por meio virtual, e realizará mensalmente reunião com o Ministério da Economia, para avaliar a situação fiscal e execução orçamentária e financeira das medidas relacionadas à emergência de saúde pública de importância nacional relacionada ao coronavírus. (composição de 6 deputados e 6 senadores).

 

2. MEDIDAS PROVISÓRIAS EM RAZÃO EM RAZÃO DO ESTADO DE CALAMIDADE PÚBLICA PROVOCADO PELO CORONAVÍRUS (COVID-19)

2.1 O QUE É UMA MEDIDA PROVISÓRIA? E QUAL SEU PROCEDIMENTO?

a) Conceito: Relevância e urgência. (Artigo 62, CF/1988)

- Relevância e urgência: Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional

 

b) Prazo para deliberação[3] do Congresso Nacional:

- 60 (sessenta dias): As medidas provisórias, perderão eficácia, desde a edição, se não forem convertidas em lei no prazo de sessenta dias.

  •                 Conta-se este prazo da publicação da medida provisória.
  •                 Suspende-se no período de recesso do Congresso Nacional.

- Prorrogação do prazo: Este prazo, é prorrogável, uma vez por mais sessenta dias. Porém, somente será prorrogada a medida provisória que, no prazo de sessenta dias, contado de sua publicação, não tiver a sua votação encerrada nas duas Casas do Congresso Nacional. 

- Regime de urgência: Se a medida provisória não for apreciada em até 45 (quarenta e cinco) dias contados de sua publicação, entrará em regime de urgência, subsequentemente, em cada uma das Casas do Congresso Nacional, ficando sobrestadas, todas as demais deliberações legislativas da Casa em que estiver tramitando (até que se finalize a votação).

 

c) Início da votação: As medidas provisórias terão sua votação iniciada na Câmara dos Deputados

 

d) Juízo prévio de atendimento dos pressupostos constitucionais

A deliberação de cada uma das Casas do Congresso Nacional sobre o mérito das medidas provisórias dependerá de juízo prévio sobre o atendimento de seus pressupostos constitucionais.

- Comissão mista: Caberá à comissão mista de Deputados e Senadores examinar as medidas provisórias e sobre elas emitir parecer, antes de serem apreciadas, em sessão separada, pelo plenário de cada uma das Casas do Congresso Nacional.

 

e) Disciplinar as relações jurídicas decorrentes da MP: O Congresso Nacional deve disciplinar, por meio de decreto legislativo, as relações jurídicas delas decorrentes.  

- Não editado o decreto legislativo: Se não for editado até sessenta dias após a rejeição ou perda de eficácia de medida provisória, as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados durante sua vigência conservar-se-ão por ela regidas.

 

f) Aprovação da MP com alteração no texto original: Aprovado projeto de lei de conversão alterando o texto original da medida provisória, esta manter-se-á integralmente em vigor até que seja sancionado ou vetado o projeto.

 

g) Reedição de medida provisória rejeitada:  É vedada a reedição, na mesma sessão legislativa, de medida provisória que tenha sido rejeitada ou que tenha perdido sua eficácia por decurso de prazo.    

 

2.1.1 Vedações materiais: É vedada a edição de medidas provisórias sobre:

a) nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos políticos e direito eleitoral

b) direito penal, processual penal e processual civil

c) organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros;

d) planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento e créditos adicionais e suplementares.

Exceção (art. 167, § 3º) Crédito extraordinário para guerra, calamidade pública, comoção interna: A abertura de crédito extraordinário somente será admitida para atender a despesas imprevisíveis e urgentes, como as decorrentes de guerra, comoção interna ou calamidade pública, observado o disposto no art. 62.

 

2.1.2 Outras vedações:

a) Medida provisória que vise a detenção ou sequestro de bens, de poupança popular ou qualquer outro ativo financeiro.

b) reservada a lei complementar;

c) já disciplinada em projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional e pendente de sanção ou veto do Presidente da República.

 

2.1.3 Efeitos de medida provisória que implique instituição ou majoração de impostos:

- Regra: Só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada. 

- Exceção:

Imposto de importação de produtos estrangeiro;

Imposto de exportação, para o exterior, de produtos nacionais ou nacionalizados;

Imposto produtos industrializados

Imposto de operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários;

Imposto na iminência ou no caso de guerra externa, impostos extraordinários, compreendidos ou não em sua competência tributária, os quais serão suprimidos, gradativamente, cessadas as causas de sua criação.

 

2.2 MEDIDA PROVISÓRIA 948/2020: REGRAS PARA DISCIPLINAR O CANCELAMENTO DE SERVIÇOS DE RESERVAS E DE EVENTOS DOS SETORES DE TURISMO E CULTURA EM RAZÃO DO ESTADO DE CALAMIDADE PÚBLICA PELO COVID-19

2.2.1 Cancelamento de serviços, de reservas e de eventos (incluídos shows e espetáculos) em razão do coronavírus (covid-19)

Os Estados e Municípios, dispuseram de Decretos em relação ao Coronavírus, quanto a restrição à aglomeração de pessoas. Por este fato, muitos eventos e viagens de turismo foram cancelados. O que pode ser feito?

 

a) REGRA - Reembolso do valor:

Todavia, não há obrigação por parte do prestador ou empresário

O prestador de serviços ou a sociedade empresária, não serão obrigados a reembolsar os valores pagos pelo consumidor na forma do artigo 2º da MP nº 948/2020, desde que assegurem certas condições.

a.1 Remarcação: Remarcação dos serviços, das reservas ou dos eventos cancelados:

1º) Respeitando a sazonalidade e os valores dos serviços originalmente contratados.

Exemplo: A reserva do hotel era na baixa temporada. O consumidor não terá direito de remarcar a reserva para a alta temporada.[4]

 

2º) Prazo para remarcação: 12 meses.

Os 12 meses são contados da data de encerramento do estado de calamidade pública.

 

a.2 Credito ou abatimento: Disponibilização de crédito para uso/abatimento na compra de outros serviços, reservar e eventos, disponíveis nas respectivas empresas

Este crédito pode ser utilizado pelo consumidor no prazo de doze meses, contado da data de encerramento do Estado de Calamidade Pública reconhecido pelo Decreto 6/2020.

 

a.3 Acordo

Além das duas outras hipóteses, pode ser feito um acordo a ser formalizado com o consumidor.

 

2.2.1.1 A quem se aplica (a remarcação, crédito/abatimento/acordo, nas formas acima).

a) Prestadores de serviços turísticos e sociedades empresárias

#São prestadoras de serviços turísticos[5], as que prestem estes serviços remunerados e com as atividades relacionadas à:

  • Meios de hospedagem (hotel)
  • Agencias de turismo
  • Transportadoras turísticas
  • Organizadora de eventos
  • Parques temáticos
  • Acampamentos turísticos

 

#Além das acima, podem ser cadastradas no Ministério do Turismo:

  • Restaurantes, cafeterias, bares e similares.
  • Centros ou locais destinados a convenções, feitas de exposições
  • Parques temáticos aquáticos e empreendimento dotados de equipamentos de entretenimento e lazer
  • Marinas e empreendimentos de apoio ao turismo náutico ou a pesca esportiva
  • Casas de espetáculos e equipamentos de animação turística
  • Organizadores, promoteres e prestadores de serviços de infra-estruttura, locação de equipamentos e montadoras de feiras de negócios, exposição e eventos.
  • Locadoras de veículos para turistas
  • Prestadoras de serviços especializados na realização e promoção das diversas modalidades dos segmentos turísticos, inclusive atrações turísticas e empresas de planejamento, bem como a prática de suas atividades.

 

2.2.1.2  Prazo para solicitação

O prazo para solicitação sem custo adicional, taxa ou multa ao consumidor, é de noventa dias, contado da data de entrada em vigor da Medida Provisória (que entrou em vigor em 08/04/2020). Dessa forma, o prazo se encerra em 07/07/2020.

 

2.2.1.3 Impossibilidade de remarcação ou acordo

a) Devolução do valor: O prestador de serviço ou empresa, deverá restituir o valor recebido ao consumidor.

  • Valor atualizado monetariamente pelo IPCA-E
  • Prazo de 12 meses, contado da data de encerramento do estado de calamidade pública.

 

2.2.2 Artistas já contratados até a data da MP e cancelamento de eventos/shows

a) Reembolso: Os artistas não terão a obrigação de reembolsar imediatamente os valores dos serviços ou cachês.

#Remarcação: O não reembolso fica condicionado a remarcação do evento/show, no prazo de 12 meses, contato da data do encerramento do Estado de Calamidade Pública.

b) Não realização do evento por parte do artista: Deve restituir o valor recebido.

  • Atualizado monetariamente pelo IPCA-E.
  • Prazo de 12 meses, contato da data de encerramento do estado de calamidade pública.

 

2.2.3 Caso fortuito ou força maior: Não enseja dano moral

Os casos estabelecidos na medida provisória, são considerados como hipóteses de caso fortuito e força maior.

  • Não ensejam danos morais.
  • Não ensejam aplicação de multa ou outras penalidades.
  • Não aplica as sanções do artigo 56 do CDC.  

 

2.2.4  A edição da referida Medida Provisória fere o Código de Defesa ao Consumidor?

O diploma não fere o CDC porque se enquadra no contexto de urgência e relevância, previsto no artigo 62 da Constituição[6], tem efeitos por tempo determinado (durante o estado de calamidade pública) e não retira nenhum direito já garantido ao consumidor. "Apenas relativiza a ordem de prioridades desses direitos.[7]

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2.3 MEDIDA PROVISÓRIA 925/2020: SOBRE MEDIDAS EMERGENCIAIS PARA A AVIAÇÃO CIVIL BRASILEIRA EM RAZÃO DA PANDEMIA DA COVID-19.

A referida MP dispõe sobre medidas emergenciais para a aviação civil brasileira em razão da pandemia da covid-19.

 

a) Contratos de concessão de aeroportos firmados pelo Governo Federal: As contribuições fixas e as variáveis com vencimento no ano de 2020 poderão ser pagas até o dia 18 de dezembro de 2020.

 

b) Prazo para reembolso de passagens: O prazo para o reembolso do valor relativo à compra de passagens aéreas será de doze meses, (ao invés de 7 dias como é a regra) observadas as regras do serviço contratado e mantida a assistência material, nos termos da regulamentação vigente.

 

c) Isenção penalidades contratuais: Os consumidores que aceitarem oferta de crédito (ao invés do reembolso) ficarão isentos das penalidades contratuais. Essa aceitação de crédito será para utilização no prazo de doze meses, contado da data do voo contratado.

 

d) Quais contratos são atingidos: O disposto neste artigo aplica-se aos contratos de transporte aéreo firmados até 31 de dezembro de 2020.

 

REFERÊNCIAS:

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.

 

_______. (2020). Em sessão histórica, Senado aprova calamidade pública contra covid-19. Disponível em: <https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2020/03/20/em-sessao-historica-senado-aprova-calamidade-publica-contra-covid-19>. Acesso em: 18 out. 2018.

 

_______. Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020. Reconhece, para os fins do art. 65 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a ocorrência do estado de calamidade pública, nos termos da solicitação do Presidente da República encaminhada por meio da Mensagem nº 93, de 18 de março de 2020. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/portaria/DLG6-2020.htm>. Acesso em: 18 abr. 2020.

 

_______. Lei Complementar nº 101, de 04 de maio de 2000. Estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp101.htm>. Acesso em: 18 abr. 2020

 

_______. Medida Provisória nº 925, de 18 de março de 2020. Dispõe sobre medidas emergenciais para a aviação civil brasileira em razão da pandemia da covid-19. Disponível em: < planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2020/Mpv/mpv925.htm>. Acesso em: 18 abr. 2020.

 

_______. Medida Provisória nº 948, de 08 de abril de 2020. Dispõe sobre o cancelamento de serviços, de reservas e de eventos dos setores de turismo e cultura em razão do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid-19). Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2020/Mpv/mpv948.htm>. Acesso em: 18 abr. 2020.

 

DIZER O DIREITO. (2020). MP 948/2020: disciplina as regras para cancelamento de serviços, reservas e eventos dos setores de turismo e cultura em razão do coronavírus. Disponível em: <https://www.dizerodireito.com.br/2020/04/mp-9482020-disciplina-as-regras-para.html>. Acesso em: 18 out. 2018.

 

VITAL, DANILO. (2020). MP complementa Código do Consumidor, mas peca na técnica, dizem especialistas. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2020-abr-13/mp-age-complementar-cdc-peca-tecnica-dizem-especialistas>. Acesso em: 18 out. 2018.

 

 

 


[1] https://lex.com.br/legis_27991293_MENSAGEM_N_93_DE_18_DE_MARCO_DE_2020.aspx

[2] https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2020/03/20/em-sessao-historica-senado-aprova-calamidade-publica-contra-covid-19

[3] Ato, praticado por órgãos colegiados, de decidir sobre uma questão pautada. A deliberação consiste na votação da matéria. (congressonacional.leg.br/legislacao-e-publicacoes/glossario/-/definicoes/termo/deliberação)

[4] https://www.dizerodireito.com.br/2020/04/mp-9482020-disciplina-as-regras-para.html

[5] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Lei/L11771.htm

[6]  Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional.          (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001)

 

[7] https://www.conjur.com.br/2020-abr-13/mp-age-complementar-cdc-peca-tecnica-dizem-especialistas

Sobre o autor
Hugo Henrique Ferreira Lima

Bacharel em Direito pela Universidade Paranaense, (2015-2019); Pós-graduando em Direito e Processo Previdenciário pela Faculdade IBMEC SP (Conclusão em 2021); Foi pesquisador no Programa de Iniciação Científica da Universidade Paranaense (2018-2019); Aprovado no XXVIII EXAME DE ORDEM UNIFICADO (OAB). OAB/PR sob o nº 102.867.

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